sábado, 28 de março de 2009

QUEM DERA SER MAIS UM DOS DISTRAÍDOS

Sonhos desencontrados são uma desgraça para os (trans)lúcidos
acordados mas de olhos distorcidos
aflitos somos, estamos, vivemos
quem dera ser mais um dos distraídos.

Eu nunca pisei de verdade no chão
os passos entendo como em falso sempre
crateras
sarjetas
umbrais.

Eu tento me soltar das camadas aéreas mas o vácuo
me rejeita.

Há algo em mim que eu quero e espero
mas apenas
de mim.

Julgo pensar mas nunca me mergulhei de verdade
me instigo e me incomodo com a palavra "eu".

Há um misto de esperança e pesadelo
sentimentos que eu sinto e desconheço
com os olhos pregados na linha laminada dos mistérios
pareço um morto-vivo vivendo até morrer em vão
de um possível sentido.

Aflitos, somos, estamos, vivemos
quem dera ser mais um dos distraídos.

R.Braga Herculano.

EISBÄR

Sobre um bloco pesado de gelo
meu coração vai deixando de ser um coração
para ser simplesmente um pedaço de carne. Congelando

entregando cada uma de suas fibras
aos ingratos cristais da inércia
deixando seus pulsos e soluços entrevarem
no âmago da incerteza
que domina o passado velho músculo. A se selar

nas páginas de séculos que se perderão
páginas de séculos que se amarelecerão
páginas geladas de carimbos turvos
até quem sabe um possível novo ciclo. E a eternidade

que se preze é uma tundra
o fim do fim é a re-morte
quem tem a sorte de viver pra sempre
que não se atreva a ressurgir.

R.Braga Herculano.

sábado, 21 de março de 2009

SOBRE TODAS AS BEIRAS DO ABISMO, LATEJA ENTÃO A CABEÇA DE SATÉLITE...

E minha cabeça de satélite lateja.
Me vem nesta madrugada de dor um afã de escrever - mas não sou eu.
Talvez nunca fui eu.

Na ânsia de desfiar a vertigem
surgem-me linhas duplas e caracateres acesos
além de pontos múltiplos.
Nas mãos a palavra-chumbo-laser-tinta-sangue:
"Escreva poesia. Caso contrário seja um atirador de elite." - me dizem.

E o redor deu-se o torno de roleta.
Todos os oito ou oitenta e oito espíritos - cada um em seu estado
saiu de mim.

Fico só eu murcho e opaco
mas psicografo uma parte do que dizia uma de minhas almas,
era a suicida que vagueia,
no além das eiras que eixam o mundo
sobre todas as beiras do abismo - como se equilibrar nos cabos de um teleférico.

Psicografo em processo eletromagnético
e jogo tal carta num multiprocessador.

E pensando em liquidar os escritos, eis que me surge um octopus
vertendo tentáculos engarranchados,
frases desconexas e pus.

Frases desconexas me dão medo tem horas - posso estar lendo o meu epitáfio.


R.Braga Herculano.

domingo, 8 de março de 2009

ZIMBROU

Zimbrou zimbrou zimbrou nessa aurora nova
zimbrou zimbrou zimbrou após inércia em pó
zimbrou zimbrou zimbrou no chão do vale dos ossos secos
zimbrou zimbrou zimbrou eis a vida reciclada.

Gramma berida bimbala
pela grama havia suja grana entornada de ferida de gente bebida na aorta
quantas balas se perderam no caminho
mas tudo passou passou e passou.

As abelhas carrosselam outra vez
ou são ninfas?

As abelhas carrosselam
oh,cabeça viu, entranhada com o ziiim ziiim ziiim
zimzim urullala zimzim urullala zimzim zanzibar zimzalla zam
as abelhas africanas no meu núcleo cerebral
me instigando a viver paixões sintéticas.

E se for um futuro derrame?

Traque metroveque mecanocre cordicore cordicore cordicore
metroveque retraretra zimzim grrrr....
Sino soa sonso nessa superfície nonsense.
E o se?
Bleng bleng bleng gaga di bling blong.


E zimbrou zimbrou zimbrou nessa vida reciclada
zimbrou zimbrou zimbrou após o vale dos ossos secos
zimbrou zimbrou zimbrou no chão da inércia em pó
zimbrou zimbrou zimbrou eis a aurora nova.



R.Braga Herculano.

(Homenagem a Hugo Ball)

ENTENDA COMO UM PRINCÍPIO DE UM MANIFESTO (Parte I)

Vamos querer poesia
como contra-porrada
essa que não deixa de ser um murro de entrada pelas portas dos fundos (entrelinhas).

E dispersá-las mesmo.
Como os deuses dispersam limalhas acesas na Via-láctea.

Vamos dissipá-las no fundo das escotilhas
que são as abóbadas dos templos dos bêbados - mas me diz:
Há algo mais etílico do que sonhar?

R.Braga Herculano.

5:43 p.m.

Os ponteiros contagirando na escada curva
o sol já vermelho espiando a turva janela convidando-me
a caminhar na estrada morta.

Mas o sino dobra louco, hein?
O tempo fez os meus ouvidos sempre moucos
escutarem o estouro dos tambores da extratosfera
ribombos além demais daqui
fez escutar o oco dos ecos
e o rouco cuco quase já sem cordas - ele precisa viver até o tempo do tempo do tempo evanescer, ele é o senhor do tempo.

Mas o que predomina
são as canções tortas de tristes
nas rodoviárias de fins de tarde.

São harmônicas
afônicas
diante o rushear dos autobus.

E os vagabundos profetizam o marasmo de amanhã.



R.Braga Herculano.

DAS ÁRVORES

Em mangueiras, há timbus
em coqueiros,preguiça
em jenipapeiros, um chão imundo
em jaqueiras, varejeiras
em jambeiros, tapetes
em laranjeiras, vizinhos
em goiabeiras, tapurus
em tangerineiras, tem eu
em caramboleiras, infância
em gravioleiras, desmetrópoles
em mamoeiros, ninguém
em amendoeiras, todos
e nos araçaeiros não tem nem mundo mais.

R.Braga Herculano.